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Tamara Klink e sua travessia poética do Oceano Atlântico

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Jovem velejadora transformou em literatura a jornada de autodescoberta e empoderamento dentro de um barco de oito metros

“Quantas mães choraram, quantas noivas ficaram por casar para que fosses nosso, ó mar!”. É com a citação do poema Mar Português, de Fernando Pessoa, que Tamara Klink fala sobre sua presença intrinsecamente feminina no oceano. As mulheres, no decorrer da história, sempre ocuparam o cais, não o barco. Havia até uma superstição que rondava suas ocupações nesses espaços: sinal de má sorte. 

No entanto, Tamara foi de encontro a esse imaginário. Sonhava com as águas e pensava nelas toda vez que via o pai, Amyr Klink, navegando quando criança. Queria navegar também, como ele. Mas o apoio não veio fácil. Na verdade, a resposta familiar foi tão contrária que ela escondeu seu plano de atravessar o Atlântico. “Eu tinha tanto medo que eu não contei pra ninguém que eu faria essa viagem. Eu tinha certeza que se eu falasse para minha mãe e [ela] dissesse verdades evidentes, eu ia desistir.” 

A única que acompanhou a preparação para a viagem foi sua avó, que, em segredo, viu a neta, durante um mês, organizar-se para ser a mais jovem brasileira a realizar tal travessia. “Dificilmente ela poderia ter tido a chance de sonhar navegar, não é? Para mim era uma responsabilidade permitir que outras mulheres pudessem sonhar com isso.”

Em agosto de 2020 iniciou sua rota, mas o desejo de desbravar os mares foi cultivado muito tempo antes. Tentou prospectar patrocinadores e investidores que a ajudassem a alavancar seu objetivo de comprar um barco e se manter no mar de forma que tivesse suas necessidades atendidas. Ouviu muitos nãos. “Sempre chegava num ponto onde as pessoas de mais responsabilidade olhavam o projeto e falavam assim: ‘e se essa menina morrer no mar, como é que vai ficar a imagem da nossa empresa?'”. Apesar disso, houve aqueles que acreditaram. Luiza Helena Trajano, empresária que comanda a rede de lojas Magazine Luiza, foi uma delas. 

Tamara Klink toma o Atlântico

Mesmo com a grande quantidade de desaconselhamentos vindos de diversas pessoas, Tamara tomou o oceano. “Eu parti com a certeza de que se desse errado, pelo menos eu nunca tinha estado tão perto de dar certo.” Enfrentou uma gama de desafios que a fizeram questionar se aquilo era mesmo seu sonho. Ondas de 25 metros, peças fundamentais quebradas, privação de sono, chuvas intensas e solidão foram alguns contratempos que resistiu. Conta que isso não a desanimou, mas fez com que enxergasse os problemas como aliados. 

“Eu me atinha muito aos ‘o quês’ – o que eu queria – e aos ‘comos’ – como eu ia fazer para chegar lá. E as condições e oportunidades que eu encontrei eram tão distantes do que eu imaginava que eu entendi que o principal era ter um “porquê” – porque eu estava fazendo o que eu estava fazendo. O porquê se adapta aos contextos, ele aceita as mudanças e nos leva para lugares que não sabíamos que existiam.” 

O Sardinha – nome dado ao seu barco a vela de oito metros – e a escrita foram suas únicas companhias por todo tempo que velejou da Noruega até a França. Seu livro “Mil Milhas” reúne relatos de viagem, poemas e desenhos que surgiram dessa jornada de entender-se como mulher estando distante de tudo que conhecia. 

“Os textos eram minha tábua de salvação em muitos momentos. A poesia me dava liberdade. Eu me tornava menos vítima e mais protagonista enquanto eu escrevia.” 

Este trecho foi preparatório para a grande viagem que viria a seguir, partindo do Cabo Verde, na costa africana, até o Brasil. 

E essa retomada do lugar que sempre fora dela é algo que deseja para todas as mulheres. Até porque, ser protagonista da história que escolheu para si foi o fator determinante que a fez se entender por completo. “Eu espero muito que seja normal as mulheres navegarem tanto na terra como no mar, e serem comandantes das suas próprias travessias, dos seus próprios barcos.” 

Texto: Maria Edhuarda Gonzaga / Entrevista: Patricia Travassos

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