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Barbie e o tsunami cor de rosa: futuro e o passado na escalada da emoção

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O que podemos aprender com o sucesso estrondoso do filme Barbie

Segunda-feira, 20:20, Shopping Eldorado, zona oeste de São Paulo (e olha que o fim de semana de estreia já passou). No horário marcado para o filme começar, o saguão ainda está lotado. Famílias inteiras vestidas de rosa. Alguns figurinos caprichados lembram a Barbie em dia de festa, com salto alto, saia rodada, tule e até luzes piscantes. Diferentes gerações aguardam ansiosas, em fila, para fazer poses, tirar e postar (claro) fotos dentro da embalagem e do carro conversível da boneca. Enquanto isso, a sala ainda está praticamente vazia. Ok, os trailers iniciais costumam atrasar o início da sessão, mas muita gente parece não se importar em perder o comecinho do filme. Afinal, alguns já chegam com a opinião formada: antes mesmo de assistir, têm certeza de que já “gostaram” do filme. 

O que levou a bilheteria de Barbie a superar todos os recordes? 

A ideia aqui é tentar entender o que tanto motiva o público a ponto de tirá-lo de casa para retornar às salas de cinema que andavam tão vazias desde a pandemia? Ok, o cinema tem registrado alguns soluços de esperança nesses últimos tempos. Mas, até agora, o que tem vendido ingressos são os filmes de super-heróis, ação e ficção científica que, indiscutivelmente, ficam muito melhores quando exibidos em telas gigantes. 

Esse não é exatamente o caso da Barbie, embora seja uma produção esteticamente impecável. Para mim, a origem desse efeito manada tem outro nome: é o Marketing de Nostalgia (associado ao Marketing do Futuro do qual falarei mais adiante). A boneca da Mattel busca conexão direta com o passado e a memória afetiva dos espectadores, que encontram conforto, leveza (e uma boa dose de ironia) num universo agradável e pra lá de familiar. 

Passado e futuro: um presente para as salas de cinema 

Foi esse mesmo apelo que levou outros dois filmes a entrarem para a lista das melhores bilheterias desde a retomada pós-Covid: o Top Gun: Maverick (com Tom Cruise, Val Kilmer e Miles Teller revivendo seus personagens 36 anos depois) e o Super Mario Bros, que turbinou, com tecnologia de cinema 3D, o sucesso do game da década de 1980. 

Além dos filmes, a música brasileira também tem apostado na fórmula da saudade. A atual temporada de shows da banda Titãs (em formação original) prova que gerações inteiras estão dispostas a se reencontrar nos estádios para reviver a juventude de forma coletiva (por quê não, catártica?), por meio de superproduções que usam tecnologias avançadas de áudio e vídeo para reavivar memórias guardadas em mídias antigas, quase apagadas pelo tempo.

O que dizer sobre o efeito causado pela propaganda da nova Kombi que reuniu Maria Rita à saudosa Elis Regina, num encontro tão inédito quanto digital de talentos entre mãe e filha? A inteligência artificial tem promovido emoções das mais naturais e profundas, gerando um efeito em proporções muito maiores do que se pode prever. Os atores de Hollywood estão assustados e protestam contra a ameaça de suas réplicas digitais e da possibilidade de a manipulação de suas imagens virar uma rotina.  

O que acontece quando o passado encontra o futuro no marketing?

O Marketing do Futuro é um manifesto criado pelo cientista Silvio Meira (em parceria com a jornalista Rosário Pompéia) que estuda os efeitos de rede gerados por estratégias em três dimensões: a física, a social e a digital. Num contexto em que a Inteligência Artificial Generativa conquista mais espaço, servindo de plataforma para expandir as nossas inteligências individuais e coletivas, as repercussões ganham outro tamanho e aceleração. Se faltava emoção nesse caldeirão tecnológico do marketing digital, a nostalgia chega como ingrediente fundamental, impulsionando a comunicação para uma escala exponencial. 

Talvez isso explique a escolha da cena que abre o filme da Barbie, em referência direta a um verdadeiro clássico da história do cinema: “2001: Uma Odisseia no Espaço”. A trilha sonora impactante já nos transporta ao passado e embala a sequência de meninas destruindo suas velhas bonecas diante do surgimento da primeira Barbie. É uma explícita homenagem a Stanley Kubrick que agrada até quem só foi ver o filme levado pelo tsunami pink. Ficar de fora da caixa cor de rosa não parece uma opção, nem mesmo para os que não eram grandes fãs da boneca. 

O que podemos aprender com o tsunami da Barbie?

Será que as vendas de Barbie vão explodir? As vitrines das lojas (não só de brinquedos) aproveitaram todo o zum zum zum em torno da boneca para vestir suas vitrines de rosa. Cheguei a ler reportagens de que, na 25 de março, a venda de camisetas da boneca superou a de camisas da Seleção Brasileira de Futebol Feminino que, diga-se de passagem, estreou na Copa do Mundo na mesma semana do filme.

Sem medo de errar e sem analisar os números da economia, eu diria que o comércio em geral pegou carona no tópico mais comentado do final de julho. E isso é muito positivo se destacarmos a agilidade e a criatividade de quem percebeu em tempo a oportunidade de surfar na onda da Warner. 

Mas pra mim, fica uma lição para os próximos eventos e lançamentos de qualquer produto ou serviço: é fundamental mirar na experiência emocional do público. Os sets “instagramáveis” instalados da porta dos cinemas atraíram demais a atenção e deram às postagens força de propaganda. Os espectadores do filme queriam mostrar que estiveram presentes no evento do momento. Cada foto e cada pose na caixa ou no conversível da boneca refletia a sensação de pertencimento e uma imagem totalmente renovada para a marca. Depois de tantas críticas que sofreu ao longo dos anos, é inegável que a Mattel sai desse tsunami mais forte do que nunca, assumindo suas fragilidades, fazendo piada das críticas do passado e se posicionando sobre causas sociais sobre as quais as novas gerações não abrem mão de discutir.

Texto: Patrícia Travassos
Fotos: Warner Bros Movies e Reprodução

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